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sábado, 30 de junho de 2012


Como cheguei até aqui?...Não sei. E não vos minto, quando digo: não sei. Não sei mesmo.


Como é que alguém chega até aqui?...Não sei. Sabes, amigo? Sinto que sabes. Sinto que sabes um pouco mais. Sinto que mo queres dizer: esse “um pouco mais”. E eu quero ouvir, amigo. Morro, se não te ouço. Morro, se não te ouço, amigo. Conta-me esse “um pouco mais”. Mostra-me como se chega um pouco mais além. Mostra-me um pouco mais de mim, um pouco mais do que eu conheço e desconheço: o pouco mais daí, o pouco mais daqui.


Como cheguei até aqui? Nem eu sei. Há uma espécie de névoa, uma espécie de enlevar do sonho – um sonho que se insiste em viver, um sonho que se vive e não acaba, e a sensação de que é uma interminável faísca, um lume que conquista, mas a qualquer momento é nada –, uma espécie de morte declarada ao antes, uma espécie de infindável estrada mais adiante: o Olimpo.


Como cheguei até aqui? Recuo no tempo, relembro caminhos muito negros, portas fechadas (sempre fechadas!), vozes de dentro enclausuradas (sempre enclausuradas!), intermináveis gritos ausentes, rostos sombrios sorridentes, outros a respirar por mim, um enorme hiato temporal …um corpo que nasceu sem alma, uma alma que amadureceu sem  corpo: o vazio.


Como cheguei até aqui? A esta busca incessante. A este prestes a apagar. A este em vias de propulsar hélio. Tic-tac-tic-tac-tic-tac…Fujam!


Como cheguei até aqui, amigo? Como me hás-de ajudar, amigo? Como me hás-de ajudar, se tudo o sinto está sempre no ir, no buscar, no correr, no quase chegar – e nunca, nunca, nunca mesmo, te sinto a vir, te vejo a me sorrir, te toco no me procurar.


Como me hás-de assim segurar, ó vida?

Como cheguei até aqui, a este balanço tão agri-doce, a este não saber se o minuto a seguir me irá fugir ou guardar?


É estranho. É estranho o horizonte: Aurora Boreal.


(Conceição Sousa)

sábado, 16 de junho de 2012

no olhar que me lançaste,
encontrei-te crente da voz que é minha;
juraste perder-te em doces palavras
nas íris possessas com que me domavas;
despiste-me desta pele que não sinto
em tragos bebidos de língua;
vestiste-te, infiel, em mim,
coberto de todos os nãos
num suposto (a)deus à míngua.
no olhar que me furtaste,
ausentei-me de mim
e de todas as que conhecia;
jurei-te fidelidade, ao teu amor,
no arremessar de pedras que me cabia;
lancei todos os meus eus
num abismo insano de vontades loucas;
e todas as fantasias sentidas
só não deixaram de o ser
porque as tuas verdades se fizeram poucas.

(texto de Conceição Sousa,
fotografia de Ricardo Rocha)

sexta-feira, 8 de junho de 2012



Sentir-te, amor…

sentir-te arrepio de sol,

seda de pele na sede de lençol…

respirar pesado, do corpo escravo,

que ao leve não cede, amor: dói.

Sentir-te, amor…

sentir-te licor embriagado,

abafar suado que o traz pede,

o atrás que não se mede: encaixa.

Leve, solto, alto, amarrotado: cobre.

E despe-nos fluidez na luz do que se sabe

(do que nos sabe!) o feliz  pobre.

Sentir-te e só, amor…(h)ouve…

(texto: Conceição Sousa
foto: Ricardo Rocha)