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segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Vá: depressa. / Come on : hurry up.

Não interessa que doa,
não importa que definhe,
não é relevante que envelheça
ou sequer adoeça...
enquanto estás (enquanto és):
marca a tua posição.
Opta: para que não te entristeça;
e faz com que aconteça.
E - se bem que doa,
definhe,
envelheça
ou adoeça -
vive, ri, sê :
até que por fim (e só no fim)
faleça.
Vá: depressa.
(Conceição Sousa)

It doesn't matter if it hurts,
it isn't important if you decay,
it isn't relevant if you grow old or sick...
as long as you are here ( YOU ARE) :
take a stand.
Opt: so that it won't make you sad;
and make it happen.
And- even if it hurts,
decays, grows old or sick -
LIVE, LAUGH, BE :
until finally ( and only in the end)
it stops thee.

(by Conceição Sousa)

Paz e sossego / Peace and quiet

Paz e sossego no encontro de mim mesma.
Paz e sossego no caminho do meu sangue.
Paz e sossego no cultivar da minha aldeia.
Paz e sossego no tempo mais adiante.
Paz e sossego na alma dos que me ouvem -
e até dos que nem ouço.
Paz e sossego na voz de quem me fala -
e até na dos que se calam.
Paz e sossego na carne de quem sofre ( na resignação desse andor):
a todos os que respiram amor -
e até a quem dele desconhece o sabor.
Paz e sossego nas curvas sinuosas das estradas lacrimosas.
Paz e sossego nos cárceres contrafeitos : coragem nesses peitos -
resistência na vanguarda.
Paz e sossego na busca que nunca se alcança -
na meta da descrença:
na história que se lança.
Paz e sossego na luta do vai e vem: no rio que não volta -
no mar que te sustem.
Paz e sossego nas mágoas em redor: só dor - muita dor:
banhada em suor.
Paz e sossego nas forças que se perdem -
nas fraquezas que se amparam :
nos sonhos que voaram.
Paz e sossego nisto que é a vida: aparente beco sem saída -
saúde no percurso da mãe ferida.
Paz e sossego na alegria do acordar -
longo espreguiçar :
da ausência de morte o celebrar.
Paz no amor : sossego no amar:
sem complicar: simples tocar.
É tudo: pleno estar.
(Conceição Sousa)

Peace and quiet when meeting myself.
Peace and quiet in the way of my blood.
Peace and quiet in the growing of my village.
Peace and quiet in time ahead.
Peace and quiet in the listeners' souls -
and even in those I don't listen to.
Peace and quiet in the speakers' voices -
and even in the shutters'.
Peace and quiet in the sufferers' flesh (in the resignation of that andor):
to all those who breathe love -
even to the ones who ignore its flavour.
Peace and quiet in the sinuous curves of lachrymroses roads.
Peace and quiet in the constrained gaols:
courage in those bosoms- resilience in the forefront.
Peace and quiet in the never attained quest -
in the disbelief goals: the released story.
Peace and quiet in the turn around fight:
in the not returning river - sustained ocean.
Peace and quiet in the surrounding sorrows-
only pain - lots of pain: soaked in sweat.
Peace and quiet in the losing strength -
supported weakness: flying dream.
Peace and quiet in this that's life: apparent blind alley-
health in the hurt mother's deadlock.
Peace and quiet in the awakening joy-
long arms stretching: death absence celebrating.
Peace in LOVE: quiet in LOVING:
without complicating: simple TOUCH.
That's all: plain BEING.

(by Conceição Sousa)

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

É tudo menos não.

Trazes-me no colo (peça de ouro) desde que nasci -
na dor de me dizeres não; abdicas da vida,do sim de ti.
Choras - sei que sim - no encalço consumido de mim;
Ris nas madrugadas - no despertar da infância a voz
que embalas, tempo adentro, à desaguada foz.
Carrasco é o teu trabalho - esse de amares tua família;
na paixão com que o fazes baralhas qualquer quezília.
Aprendi a confiar no sangue que me deu o ser -
ao contornar a dor quando me impedes de viver.
Na verdade, com o passar das estações, percebo: esquivas-me de morrer.
É dura a tua luta ( ainda hoje), meu pai, bem o sei...
Mas sabes que de mim tens todo o amor: é de Deus a lei.
Oro: muitos mais anos a contemplar teu meigo olhar;
esse, gasto e sofrido no teu incansável incondicional amar.
A prece dos meus dias é que te sinta aqui neste mundo -
massacrado pelas rugas do tempo - vivo a cada segundo.
Egoísmo? Pode ser. Amor sei que sim. Receio de perder o Norte de mim.
Embora entreouça no lamentar do teu entregue estilhaçado coração
a eternidade do peso, do rigor, do afagar e proteger da tua mão.
É um amor dentro, este, o meu por ti, pai : é tudo menos não.

(Conceição Sousa)


quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Amo-te, meu querido irmão.

Há alguém, algures, que me conhece
A mim: pessoa de nenhures e de ninguém.
Alguém, a quem muito agradeço,
pois sempre que (de mim ) padeço
deita-me a mão - trazendo-me de volta: união.
É um na beira da estrada - eu derrocada-,
conforta todas as minhas faces (doces enlaces);
delas ampara as quedas: montando-as chegada.
O puzzle de mim é sua vida, ternura-
diverte-se nessa loucura - e dura lida,
unindo, tentativa após tentativa, meu beco sem saída.
Nem sempre está presente (quase nunca),
mas sei-o eterno, ali - atento ao meu tormento:
momento de si.
Hoje, especialmente hoje, quero agradecer
toda a disponibilidade sentida no seu viver -
a esse alguém que sabe quem este ninguém é,
a esse alguém que ama, sem desdém: de pé.
Sou mais nenhures do que algures, bem sei;
Sou mais não do que sim: tem sido esta a lei.
Quero que saibas aquilo que de todo sabes;
és minha criação: sangue permanente na fenda do coração.
Amo-te, meu querido irmão.

(de Conceição Sousa)

terça-feira, 16 de agosto de 2011

É hora de fazer amor...

É hora de fazer amor com alguém que amo muito, sem dor.
É hora da ternura entre os teus braços, doce loucura, amor.
É hora de dizer "amo-te" num beijo lento, bem regado, sem tento.
É hora do prazer a mim confiado, desflorado, e de p'ra sempre amar-te, danado.
É hora da emoção contida em teu coração - de fechar portas ao não.
É hora do afagar cálido de língua no corpo dorido à míngua.
É hora do tesão, meta arrastada no tempo da brava sedução.
É hora de calar o nunca que dormia na voz do sempre, vadia.
É hora do lacrimejar salgado na pele rasgada do vento estuprado.
É hora de me amares sem dó no ventre que te dou a ti, e só.
É hora de fazer amor contigo e de me suares no tempo perdido.
É hora, amor, é hora do consumido, querido.
É hora de deixares de te sentir ferido.

(Conceição Sousa )

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Entre quatro paredes

Escrevo, como sempre, no canto (mais canto) do meu quarto - sim : meu (sortuda por ter um quarto). E é apenas um quarto - poderia ser meio ou até mesmo inteiro; não deixa de ser um quarto: melhor do que nenhum. Mas, voltando ao início ( já é um círculo), escrevo como sempre escrevi. É cíclico. É rotina. É dentro. É sou. Os mesmos objectos: o caderno preto, a caneta, eu ; o mesmo acto: um objecto segura o outro e fá-lo rodopiar (por vezes no ar também) pro e contra-relógio num terceiro objecto estático. Não é justo. Há uma relação ( ou melhor três) desigual : dois dos objectos são dinâmicos, mexem-se, movimentam-se. O terceiro apenas sofre as consequências; sem qualquer hipótese de lhes escapar. Está ali, parado, a ser massacrado, à mercê. O segundo goza apenas de uma meia autonomia: a que o primeiro lhe dá. Se o primeiro não lhe pega fica ali - inactivo; se lhe pega é um mundo: faz e desfaz a seu belo prazer. O primeiro -esse sim- domina. Se quer: há ; se não quer: não há. O eu (primeiro) pega na caneta (segundo) e escreve no caderno (terceiro). Há um intruso, um estranho nesta relação de décadas : um quarto objecto: o quarto ( e lá voltamos ao quarto- eu não digo que é cíclico?). O quarto objecto também é estático, mas projecta de tal forma dinâmica que se anula na sua inacção de mero objecto estático: o computador. O que outrora era acto solitário num quarto consequência de relações desiguais continua a ser acto solitário num quarto consequência de relações desiguais; contudo, com a intrusão do quarto objecto no quarto, passou a ser meio mundo a escrever sobre e para mais meio mundo (os quartos do outro lado): o círculo - que não deixa de ser quarto. Mas, continuo a afirmar: melhor ter um quarto do que não ter nenhum.

(de Conceição Sousa)

Oh, meu amor, vieste.../ Oh, my love, you came...

Oh, meu amor, vieste - sorriso rasgado no peito.
Feliz em ti me sinto, meigo colado estar: absinto.
Em mim pleno te sei, suo salgado amar- ai, defeito.
Oh, meu amor, vieste - lágrima sufocada : vida.
Atravessas-me na alma sem dó - demasiado sofrida.
Marcas da dor tua no aperto com que me afagas.
Oh, meu amor, vieste - no embalo do sonho de mim.
Beijas-me suave na pele e mordes arranhando candura.
Soltas a fera de ti, doce loucura : ainda nos sabe fel.
Oh, meu amor, vieste e contigo teu amor trouxeste -
nosso de todas as horas e de todos os segundos;
após tantas adiadas demoras e tão parcos mundos.
Oh, meu amor, vieste : finalmente chegaste,
e agora que em meu ser entraste, retém-te : não vás.
Detém-te em mim: teu amar; meu amor,oh, por fim.

(Conceição Sousa)

Oh, my love, you came - torn smile in the breast.
Happy in you I feel, gentle glued being: absinth.
In me I know you fullfilled, salted sweated loving - oh, defect.
Oh, my love, you came - choked tear : life.
You get pitiless through my soul - too much hurt.
Scars of your pain in the pressure of your stroke.
Oh, my love, you came - in the rocking of the dream of me.
You kiss me gently in the skin and bite scratching candidness.
You release the beast in you, sweet madness: it still tastes bitterness.
Oh, my love, you came and with you your love you brought-
ours of all the hours, of all the seconds;
after so many postponed delays and so scarce worlds.
Oh, my love, you came: finally you've arrived,
and now that you're in my being, inside : hold on: don't go.
Stay in me, love; my love, oh, at last.

(by Conceição Sousa )

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

É debaixo do chuveiro que tudo se resolve


É debaixo do chuveiro que tudo - mesmo tudo - se resolve.

 Anda daí. Preparado? Tal como Deus te trouxe ao mundo?

Sentes? Diz lá. Consolado.

O formigueiro das gotículas a contagiar toda a tua pele.

O eriçar da subtil pelugem – faz vénia  à passagem do carreiro :

 vento gélido - sabe exactamente para onde vai : e vai.

O dilatar dos poros ao suave toque da madrugada;

abraçam (porque querem), esgaçando, as lágrimas –

orvalho a suster na alma carícias de todas as horas: mágoas.

É um arrepio no calafrio dos entretantos , dos porquês -  dos crês ?

Cerrar de olhos ( tranquila escuridão) no serrar da cruz que fere -

corrente de ar, ímpeto ; beija a de água : verte o amar.

E as liquefeitas estradas  do amor erguem-se;

 Carregam, em  hidro –dourado serenar, os aquedutos,

os fios humedecidos de vida : varrem o conspurcado, a morte.

E ainda tal como Deus ao mundo nos trouxe,

 comungamos o nós -  no afagar do corpo inerte : limpos.

Limpos de dor. Sofridos de amor.

Nas entrelinhas das inúmeras nascentes termais,

oriundas dos mais diversos pontos cardeais,

observamos a junção do respirar no fundo da voz.

Bramido ecoando o final da imersão -

extenso trajecto  no reclinar da emoção.

A foz que sentimos na entrada  a contra-luz.

Dos aromas e das velas o banho a incenso.

O odor seduz: e ao amor próprio conduz.

O tudo (ch)orado, esvaziado,  no chuveiro convento.

(Conceição Sousa)


quarta-feira, 10 de agosto de 2011

É só o que me basta.

És tu que me tens mesmo não tendo -sabes que sim.
Sou eu em teu olhar : o dentro - não se mostra, não se vê. É.
E tenho-te, preso na minha cruz : diamante - reluz.
Lágrima dos meus dias, das minhas noites; teimas em cair.
Varres, martirizada face, as alegrias; queimas ao seduzir.
E quero-te na ternura de todos os meus eus : beijo-te na língua -nas línguas
dormem os lençóis da bravura. Massacre. Puro massacre contido nos Céus.
Jazem, nos silêncios que se calam, as preces do vem e do toma-me.
A vida paralela (a desejada e sentida), no reflexo do espelho: simples aguarela.
A vida na membrana saboreada - não a do sexo ; verdadeira película : amada.
Serei? Confesso. Sou. Sei: num espaço só nosso, cúmplice. E é só o que me basta.

(Conceição Sousa)

domingo, 7 de agosto de 2011

Vir tudo

Não seria hora já de a mim vir tudo?
Virtude : falsa nas horas em que me mudo.
Mudo - nesta terra de ninguém e do sobre mais;
Mudo - totalmente sem pio entre os demais.
E quem diz que não mereço esta sorte?
Eu. Eu digo : afronto-te . Tu que me contrarias.
Eu grito tudo de direito : todas as de(vidas) alegrias.
Venham a mim. Somem-se sem jeito (vergonha).
Não seria já hora de a mim vir tudo?
Virtude em que me têm todos os que sabem.
E só sabe quem procura e nada encontra.
E só sabe quem busca, acha e perde.
E só sabe quem pára, fica e morre.
E só sabe quem vai, luta e corre.
Não seria hora já de a mim vir tudo?
Virtude que em mim mora sem que eu saiba.
Vir tudo que sempre esteve sem que viesse.
Tudo o que fui - sem que de mim adormecesse.
Tudo o que sou -nas vagas horas de mim mesmo.
Só sabe assim "vir tudo" o que acredita ainda vir.
Só sabe assim virtude o que está sempre pronto a : parir.

(de Conceição Sousa)

De verdade, amei-te.

No ar que te sustenho, encontro-te - átomos de dor - na calçada do céu.
Inspiro veladas partículas, ridículas poeiras de luz : do amor o véu.
Entre suspiros, em trote, o cavalo marca sua ferradura na cruz;
pára, exausto, relincha no claustro, preso ao torpor do corpo: conduz.
É o sopro : é agora. É o vento: demora. É tudo o que já foi outrora.
A vida - danada. A ora ouriçada ora apagada vida - a que também cospe.
E a morte sabe, a morte está : sempre a sorte do que será - o lado mais forte.
No ar que te respiro digo (mil vezes digo): sei-te, sinto-te, amei-te.
De verdade, amei-te.

(Conceição Sousa)

sábado, 6 de agosto de 2011

E o renascimento dá-se.

E quando ela cai, molha; e quando molha, sente-se; e ao sentir, percebe-se; e ao perceber, entranha-se; e ao entranhar-se, rejuvenesce-se; e ao rejuvenescer-se, renasce-se; e ao renascer-se, é-se feliz. E quando ela cai - a chuva -, humedece-nos na dureza da tábua rasa : desperta o odor da madeira em comunhão. Sente-se na pele do exilado a frescura na saudade do que já foi e torna a ser, o ciclo das estações- esse que insiste em permanecer e nos fazer crer. Aí : percebe-se o mundo a celebrar nossa existência, a beijar-nos na clemência de quem sabe o porquê de ainda cá estarmos, a abraçar-nos (lenta e docemente) na partilha de o comungarmos. Nesse mágico momento, entranha-se na alma o cheiro a pó no ar, da vida o pleno saborear, do " sim : sinto, estou, sou" o respirar. E celebra-se , encantamento, nessa paragem do tempo ( que ao andar nos faz recuar), gotas de orvalho o início a suster : caem na terra ; rejuvenescem - toque de fôlego vivo - o árido ser esquecido. E o renascimento dá-se : em lágrimas humedecidas - em sal faz-se. A mãe natureza diz-nos que é hora de o seu ventre sentir. E à humana curta memória relembra o ciclo do existir : com uma singela gota de chuva - tão singela - faz-nos sorrir.

(Conceição Sousa)

Maldito vazio em redor.

Por vezes, por muito que se faça, nada corre de feição. Na certeza de que é esta a hora marcamos a dita posição. E voltamos a marcar, incansavelmente, até que nos digam não. E mesmo o "não" sabendo, repetimos o acto : querendo - mesmo muito crendo. Novamente, bem na cara - resignada-, o nada. Danada vida esta : vida feita de sonhos e de nadas. Nadas que vão nas ruas lentamente (ou apressadamente) abraçados a nadas. Nadas beijando nadas : sobem escadas - jazem caladas - na certeza de que levam a nadas. Maldito vazio em redor - mágoas sentidas no momento do calor. Imensas, inúmeras, mágoas sempre ao dispor. Só dor. Que horror! É um holocausto de nadas. Onde fica nisto tudo - nesta enchente de nadas ( neste vazio de contos de fadas)- o amor? Procura-se e, sem se procurar, encontra-se. Encontra-se e, sem se (de facto) encontrar, perde-se. Perde-se e, sem nada perder, busca-se. Busca-se e, ao tudo buscar, mata-se. Mata-se e, ao se matar, nasce -se. Renasce-se num novo lugar, olhando em redor, sem nada reconhecer nem nada encontrar a não ser o próprio amor. Esse que, na verdade, nunca saiu do lugar. Apenas estava no fundo do poço - vazio de água e de luz- a nadar. Aguardava a hora da dita posição marcar - essa que, por muito que se faça, nos continuam a negar. Danada de vida esta: sem par. Chora o que tiveres de chorar, mas mesmo sentindo-te nada -sendo nada-, não deixes nunca de te amar. E, já agora, boa caminhada.

(Conceição Sousa)

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Curto/Longo ensaio sobre o tempo

Tempo? O que é esta coisa do tempo? Ponteiros - que já não são ponteiros (mas meros sinais gráficos que ciclicamente alternam entre si :ciclicamente) - em movimento ascendente e descendente , e outra vez, o ascender e o descender : na roda, no círculo, na curva fechada. Tempo? Aonde que não o vejo - não o sinto. No deslizar do veículo a motor - nesse que acelera e trava. O que é isto? Acelerei e já lá estou. Abrandei e nunca mais chego. Travei e paro. E se acelerar estou lá. Se abrandar ainda vou. Se travar fiquei. O que é isto? Tempo? Será meu? Ou do veículo? É do motor. Não. É do petróleo. É do homem que extrai o petróleo. Não. É do dinheiro que paga ao homem e que compra o petróleo. Não. É meu se não quiser comprar nem o homem, nem o dinheiro, nem o petróleo. É meu se não quiser entrar no veículo. É meu se não quiser olhar para o relógio - nem sequer tenho relógio ; mas tenho o tempo. Tenho? Não serei eu o tempo? Ou será o tempo eu? Mas que coisa é esta do tempo? Se falta a saúde - venha o veículo mais rápido que vier, ou o petróleo mais potente que houver, ou o dinheiro mais caro que existir -, se falta a saúde : falta o tempo. E mesmo com saúde ou na falta dela, com mais tempo ou menos tempo, se o tempo quiser acaba-se o tempo: morre ali. Mas morre para quem? Para ti? Para mim? Para o tempo? Morre para todos (e para tudo) os que entenderem que já não vale a pena perder ou ganhar tempo. Mesmo que haja tempo há quem decida que se acabou o tempo. E de quem é ( ou do que é) o tempo afinal? Dos que não querem perder tempo? Dos que querem ganhar tempo? Ou dos que se estão simplesmente marimbando para o tempo? Corre : se queres chegar a tempo. Pára: se isso é pura perda de tempo. Abranda: se ainda não te decidiste a tempo. Que coisa complicada esta: a do tempo. Se conseguiste chegar a tempo de ler o ínicio deste texto e levaste o teu tempo para chegar a tempo do fim : parabéns! Estás dentro do teu e do meu tempo :este /esse que já foi tempo. O que é agora, não sei.

(de Conceição Sousa)