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quarta-feira, 4 de julho de 2012



Contemplo,  ao longe,


como que numa película de um outro filme,


espaços


( aromas, cores, toques, sons, paladares…)


 e pessoas


(afectos, laços, carinhos, olhares , sorrisos…)


 de outrora –

as mesmas, exactamente as mesmas


(embora os corpos mais enrugados, mais envelhecidos, mais empedernidos,


 mais decaídos, mais ternurentos, mais silenciosos, mais apagados, mais tristes,


mais ausentes)


que trago comigo neste filme


de agora.


E até eu, naquele tempo longínquo,


já não me pareço eu,


mas um outro que atrás de mim minto:


um outro que imagino ter sido real


( e foi! – assim o dizem as fotografias, as folhas amarelecidas,

as letras esvanecidas, as fitas repletas de gente, de movimentos e sons


e ruídos de palpável : o simples trabalhar do rio na sua correnteza),


que, embora o tenha sido (real?), agora duvido lá ter sequer estado –


naquele tempo, naquele lugar, naquele amar. Estranho…


E não são as fotografias, as fitas, os pedaços embrulhados e rasgados de papel,


que me dizem lá ter estado, não! É mesmo esta ternura com que revejo esses


lugares, essas pessoas ( a minha de outrora também).


Sei que nem sempre foi bom, nem sempre foi sereno, nem sempre foi pacífico.


Sei que, na verdade,  foi sempre com raiva, com luta, com paixão, com ódio até!


(do bom, do que quer bem…)

Mas, agora , não são essas as pessoas que ficaram,


não são essas as pessoas que estão.


As que ficaram, as que estão, são as do abraçar, do amparar,


do guardar, do proteger,  do acarinhar, do beijar, do amar.


A ventania foi-se, o vendaval foi-se,  a monção foi-se.


Ficou a terra húmida serena das lágrimas felizes.


Ficou o rio sorridente da cascata tranquila.


Ficou o oceano sussurrante da casa que guarda,


do lar que preserva, do monte que acolhe, da ferida que conserva.

Ficou o amar. Pura e simplesmente o amar.


Porque todos os astros que se ergueram,


todos os movimentos que erraram, todas as tempestades intransponíveis


que se juntaram


(sei-o, agora),


eram o seio de Deus -


a segurar as suas partículas em colo firme e coeso,


a amamentar de vida as fendas por preencher, por acabar,


por esvaziar -,

eram o caminhante  por navegar, o horizonte por descobrir,


o avanço por antecipar,


eram tu ( só tu) a me chamar, origem: encaixar.


Desbobinar. Contemplo…



(Conceição Sousa)

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