Número total de visualizações de páginas

terça-feira, 10 de junho de 2014

15* Um cão, um gato talvez?

15*
Um cão, gato talvez?
Não deveria ter nascido pessoa, deveria ter nascido animal doméstico, um cão, um gato talvez, tenho este ímpeto de acarinhar, de estender a pata para te afagar o rosto, para te sentir bem-vindo, e olho... olho um olhar infinito de ternura, um olhar resiliente, precisado da tua voz, do teu sorriso, da tua incomensurável atenção.
Não deveria ter nascido pessoa, um animal doméstico, sim, um cão, um gato talvez, uma alma, igual a tantas outras, enclausurada num pedaço de carne que queima, um infindável pedido de auxílio, um não pestanejar hirto a abraçar o seu dono, a aguardar ininterruptamente o instante do calor, um cão, um gato talvez, só porque nunca falo, só porque nunca verbalizo, só porque nunca digo com as palavras - p'ra que preciso delas? -, só porque não me querem as pessoas como eu quero que elas me queiram. Sou orelhas pontiagudas e olhar resiliente: observo e aguardo - p'ra que preciso das palavras?
Um cão, um gato talvez, e muda de verbo talvez o mundo me quisesse, ou acabasse comigo de vez.
A crueldade é ser pessoa, quando me sinto alma enclausurada no interior de um animal doméstico, um que fala demais, e que tudo o que deseja é que lhe consintam o instante de um afagar de rosto e de um cafuné.
E porque sou pessoa as pessoas complicam tanto...


Conceição Sousa

Sem comentários:

Enviar um comentário