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quarta-feira, 25 de setembro de 2013

28* amo-te


Estou a olhar p'ra ti e não consigo tocar-te.
Estás a olhar para mim.
Sabes-me.
E não consegues tocar-me.
Olhamo-nos com a ferocidade ternurenta de uma década
a que nos dedicamos um silêncio argumentado à exaustão.
E não consegues tocar-me.
Esse silêncio que não se impede de me gritar aos ouvidos a todo o instante:
amo-te, amo-te, amo-te, amo-te.
Cala-te, por favor! Cala-te, meu amor, cala-te.
Amo-te, amo-te, amo-te, amo-te...
Que queres que te diga? Amo-te, amo-te, amo-te...
Os meus pés, os teus pés, não arredam do sítio onde estão,
do sítio onde olho para o teu olhar em mim,
e eu em ti,
com uma ferocidade ternurenta.
Não nos tocamos, não nos falamos, não nos movemos;
 nas lágrimas que escorrem p'ra dentro dos lábios cerrados, dizemo-nos:
amo-te, amo-te, amo-te, amo-te...
eu, parada em ti; tu, parado em mim.
Nós parámos o tempo, meu amor.
Nós seduzimos o tempo
naquele segundo em que, com uma ferocidade ternurenta,
nos silenciamos um diálogo constante, só nosso,
tão no ínfimo ponto de luz onde tudo começa e tudo acaba.
Daquele lugar não há retorno.
E eu não quero que haja retorno, meu amor.
Rostos imóveis.
Apenas as lágrimas indicam o sítio onde moramos.
Apenas as lágrimas confessam isto
que nem movimento nem voz conseguem abarcar,
com uma ferocidade ternurenta:
amo-te, amo-te, amo-te, amo-te...

Conceição Sousa

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