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quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Sou Mãe.



Houve uma época em que era mãe quase a tempo inteiro. Uma época que durou quase uma década. Nessa época, anulou uma parte de si, uma parte muito importante de si - mas não uma parte essencial de si (como se viria a comprovar à época).
E, anular, não será a palavra mais adequada. Digamos que a sua parte mais essencial, à época, tomou o comando quase a tempo inteiro: sou Mãe. O deslumbramento de ser Mãe; o friozinho na barriga de ser Mãe; o saber que uma pequena desatenção poderia resultar numa crueldade feroz para alguém que se alimentou, gerou, partilhou fluídos, fez parte literalmente (em pele, carne, osso e sangue), e saiu de dentro de si.
Alguém que tem aqueles olhos expectantes constantemente postos em si.
Alguém que, para sobreviver, depende de si: do calor do seu corpo, do seu leite, do seu cuidado, da sua alma, do seu amor.
Alguém, a quem teve de ensinar, a tempo inteiro, a comer, a beber, a falar, a andar, a controlar os esfíncteres e o fluxo urinário, a não morrer (por não ter noção do perigo que é uma queda, um abismo, um gole de detergente, um comprimido esquecido na banca, o pendurar-se num móvel que desliza e lhe cai em cima...), a viver, a amar.
E, mesmo com todos os cuidados e em estado de permanente alerta (que nem as luzes e o som intermitentes de uma ambulância), aconteceram imprevistos não previsíveis, dores de cabeça e atitudes desesperadas de salvamento, como, por exemplo, pegar na criança pelos pés e dar-lhe pancadas nas costas para que soltasse as gotas vitamínicas que lhe enegreciam a pele por terem entrado e obstruido o canal de respiração. Quem imaginaria tal? Uff! Que alívio!Respiras!
Mas o sorriso...o sorriso que se prolonga, desde essa época...esse, nunca acaba. O sorriso que se fortaleceu com as histórias de encantar e o "só mais uma, mamã!"; o sorriso que faz doer o maxilar no contínuo questionar: "mas, porquê, mamã?".Uma corrente inacabável de porquês. E um agradável cansaço: sou Mãe.
É certo que sou outras coisas, no entretanto; é certo que os sinto a começar a caminhar pelo próprio pé; é certo que outras partes de mim, agora, chamam - outras só minhas, mas por eles ( sempre por eles). No entanto, é um facto que o sou(e acima de tudo) para nunca deixar de o ser: Mãe.
- O que faço agora, minha Mãe?
(de Conceição Sousa)

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