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sexta-feira, 19 de abril de 2013

conta-gotas

E tu foste, a conta-gotas, embora.
Nem demos fé, mas foste. Foste mesmo.
Sentei-me à mesa, o guardanapo que não pus
disse-me que beijavas um outro, cor de cereja
e - cá entre nós - tão enciumado,
só queríamos senti-lo, ao usado.
A tua voz ao fundo, na companhia do televisor,
doía quando, ao actor, a actriz tudo pedia -
e não é que ele, com o teu desejo nos olhos, a ela concedia?
A cama aberta, assim a deixaste, todas as manhãs,
sempre desfeita, sempre vazia, sempre a loção de barbear
que em vez de servir se despedia
e ía em vez de vir, ía... a maldita ía.
À noite, o relógio contava-me, nos números
que se revezavam,
os nossos turnos;
sabia que vivias algures
num colo mais importante,
e que havias de chegar cá, como sempre chegavas,
ao nenhures -
era só o tempo dos lençóis frios
me esquecerem...
e soube que te foste mesmo
quando deitaste
e eles fingiram me adormecer.

(Conceição Sousa)

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