Regardless of what you may think,
there will always be a sort of Divine
acknowledging you and sending you signs
for what you should or shouldn't do.
I might risk saying that your thoughts
before being thoughts
are a rough ink sent by the gods and goddesses.
Your task is to change it
into a daily, but not deadly, repeated awakened writing
by learning through the previous mistakes.
And we call the outcome: life.
It's time for you to awake again.
(Conceição Sousa)
Para quem respira... nem que seja um pequeno sopro. Eu ainda respiro logo sonho... Ainda que doa ao doer, doa mais ao doar: doa-te.
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quarta-feira, 30 de janeiro de 2013
desfigurada
Não houve um único dia da minha vida em que não pensasse em ti
antes mesmo de pensar em mim.
E é nos momentos mais difíceis,
em que o espírito se espartilha ao ponto do estilhaço,
que me mostras a tua face desfigurada
a pedir o encaixe perfeito da minha - a outra.
Dou-ta sempre, no olhar que te entrego,
para que sintas como é bonita a tua pele.
Essa que me leva ao mais íntimo de ti
e te devolve inteiro,
no brilho ímpar do teu sorriso.
É aí que eu ouço: meu amor.
(Conceição Sousa)
*
antes mesmo de pensar em mim.
E é nos momentos mais difíceis,
em que o espírito se espartilha ao ponto do estilhaço,
que me mostras a tua face desfigurada
a pedir o encaixe perfeito da minha - a outra.
Dou-ta sempre, no olhar que te entrego,
para que sintas como é bonita a tua pele.
Essa que me leva ao mais íntimo de ti
e te devolve inteiro,
no brilho ímpar do teu sorriso.
É aí que eu ouço: meu amor.
(Conceição Sousa)
*
terça-feira, 29 de janeiro de 2013
se eu fosse uma lágrima
Se eu fosse uma lágrima,
não quereria nunca te amar,
para que, ao ser magoada,
nunca acontecesse o instante de teres de me expulsar.
( Conceição Sousa)
não quereria nunca te amar,
para que, ao ser magoada,
nunca acontecesse o instante de teres de me expulsar.
( Conceição Sousa)
pequena morte
Barra mais uma das tuas mortes em mim
e desliza pela vida adentro
no sabor de nos lambermos,
felinos feridos,
à chegada da sétima, a de verdade,
no encalço de todas as outras pequenas quedas.
(Conceição Sousa)
*
e desliza pela vida adentro
no sabor de nos lambermos,
felinos feridos,
à chegada da sétima, a de verdade,
no encalço de todas as outras pequenas quedas.
(Conceição Sousa)
*
Está sempre a acontecer
Está sempre a acontecer.
Acredita que não vi, não ouvi, não cheirei, não toquei, não saboreei.
Acredita que nem p'raí olhei.
E num mesmo hiato de tempo, falamos a mesma língua, as mesmas palavras,
as mesmas imagens, os mesmos odores, os mesmos sons,
os mesmos paladares, o mesmo toque.
Acredita: sei que aí não estive -
pelo menos da forma comum que estar é.
Há algo a aproximar-nos, algo a sintonizar-nos, algo no cosmos -
ou uma porta diferente que se aprumou e abriu em nossos cérebros,
uma espécie de fibra óptica que faz com que o pensamento chegue até nós
(de ti para mim e de mim para ti)
antes de o ser na ponta da língua, dos dedos, da pele.
Estou em crer que quando acabar de registar estas palavras, já tu as disseste,
e quando abrir a janela p'ra te ouvir,
só me sussurrarás, o que já sabemos, porque to estou, agora, a pedir.
Explica-me.
(Conceição Sousa)
*
Acredita que não vi, não ouvi, não cheirei, não toquei, não saboreei.
Acredita que nem p'raí olhei.
E num mesmo hiato de tempo, falamos a mesma língua, as mesmas palavras,
as mesmas imagens, os mesmos odores, os mesmos sons,
os mesmos paladares, o mesmo toque.
Acredita: sei que aí não estive -
pelo menos da forma comum que estar é.
Há algo a aproximar-nos, algo a sintonizar-nos, algo no cosmos -
ou uma porta diferente que se aprumou e abriu em nossos cérebros,
uma espécie de fibra óptica que faz com que o pensamento chegue até nós
(de ti para mim e de mim para ti)
antes de o ser na ponta da língua, dos dedos, da pele.
Estou em crer que quando acabar de registar estas palavras, já tu as disseste,
e quando abrir a janela p'ra te ouvir,
só me sussurrarás, o que já sabemos, porque to estou, agora, a pedir.
Explica-me.
(Conceição Sousa)
*
ombro
É bom saber que me escutas
e que, de todas as vezes, ajeitas o ombro p'ra mim.
Também te escuto, é certo.
E, de todas as vezes, te deitas no meu colo.
Acordo, de todas as vezes, porque te sei aqui,
a acordar porque me sabes aí;
e adormeço, de todas as vezes,
porque me acolhes aí,
quando eu já aqui te acolhi.
É, amor.
(Conceição Sousa)
*
e que, de todas as vezes, ajeitas o ombro p'ra mim.
Também te escuto, é certo.
E, de todas as vezes, te deitas no meu colo.
Acordo, de todas as vezes, porque te sei aqui,
a acordar porque me sabes aí;
e adormeço, de todas as vezes,
porque me acolhes aí,
quando eu já aqui te acolhi.
É, amor.
(Conceição Sousa)
*
perfeitos?
Nunca te disse que era perfeita -
sendo que perfeita é apenas a noção do mim que desejas
e que te baila há muito nessa cabeça.
Sou apenas mais uma, como tantos outros.
Quando estou triste, digo que estou triste,
choro se tiver vontade, e, sim,
habitualmente escondo-me algures para ninguém ver.
Não é que sinta vergonha,
simplesmente chorar é demasiado íntimo para que alguém assista na plateia.
Anseio o teu abraço e entristeço-me porque não o tenho,
e choro porque continuo sem o ter.
Anseio o teu beijo e entristeço-me porque só o sonho,
e choro porque continuo a sonhá-lo.
Anseio o teu carinho, o teu respeito,
e entristeço-me porque não me olhas,
e choro porque continuas sem me ver.
Mas é assim a vida - que hei-de eu fazer?
Escrevo para ti, e entristeço-me porque não me mostras que me lês,
e choro porque continuas nesse canto sem voz,
sem me dizer que sou bonita e que me amas.
E, assim, serias perfeito para mim.
Mas tu nunca me disseste que eras perfeito.
(Conceição Sousa)
*
sendo que perfeita é apenas a noção do mim que desejas
e que te baila há muito nessa cabeça.
Sou apenas mais uma, como tantos outros.
Quando estou triste, digo que estou triste,
choro se tiver vontade, e, sim,
habitualmente escondo-me algures para ninguém ver.
Não é que sinta vergonha,
simplesmente chorar é demasiado íntimo para que alguém assista na plateia.
Anseio o teu abraço e entristeço-me porque não o tenho,
e choro porque continuo sem o ter.
Anseio o teu beijo e entristeço-me porque só o sonho,
e choro porque continuo a sonhá-lo.
Anseio o teu carinho, o teu respeito,
e entristeço-me porque não me olhas,
e choro porque continuas sem me ver.
Mas é assim a vida - que hei-de eu fazer?
Escrevo para ti, e entristeço-me porque não me mostras que me lês,
e choro porque continuas nesse canto sem voz,
sem me dizer que sou bonita e que me amas.
E, assim, serias perfeito para mim.
Mas tu nunca me disseste que eras perfeito.
(Conceição Sousa)
*
O que é o amor ?
E o que é o amor?
É quando nos aceitam singulares no seio de dois.
É quando nos respeitam, e ao nosso caos, e apoiam -
mesmo sabendo que dóis, amor.
É sentir-te, calor, na minha pele, a afagar-me a tez
quando te digo que sou frágil que nem o riso de uma criança. Sabe bem saber que te tenho na escuridão de todos os meus reivindicantes infernos,
e que aconchegas nos teus ombros atentos e forte...s
todos os meus medos gelados, em todos os invernos somados.
O amor é ouvir a tua voz a procurar-me na multidão,
sentir a tua mão segurar a minha mão,
e deixar-me ir, como uma prece,
na esperança de que o céu se lembre primeiro de mim
e te permita mais alguns passos na terra,
só para que não seja a minha mão a largar a tua.
Obrigada por me fazeres sentir, ao segundo, que sou amada.
(Conceição Sousa in "Um Doce Travo a Fel.")
*
É quando nos aceitam singulares no seio de dois.
É quando nos respeitam, e ao nosso caos, e apoiam -
mesmo sabendo que dóis, amor.
É sentir-te, calor, na minha pele, a afagar-me a tez
quando te digo que sou frágil que nem o riso de uma criança. Sabe bem saber que te tenho na escuridão de todos os meus reivindicantes infernos,
e que aconchegas nos teus ombros atentos e forte...s
todos os meus medos gelados, em todos os invernos somados.
O amor é ouvir a tua voz a procurar-me na multidão,
sentir a tua mão segurar a minha mão,
e deixar-me ir, como uma prece,
na esperança de que o céu se lembre primeiro de mim
e te permita mais alguns passos na terra,
só para que não seja a minha mão a largar a tua.
Obrigada por me fazeres sentir, ao segundo, que sou amada.
(Conceição Sousa in "Um Doce Travo a Fel.")
*
sexta-feira, 25 de janeiro de 2013
virmos
Quando nos virmos,
sei que não diremos uma palavra
(e, no entanto, no silêncio, não deixaremos de nos mandar calar),
fingiremos não nos ver
(embora impedidos de nos desviar o olhar),
mas o sorriso estará lá, bem à vista de todos, subtil nos cantos
(contudo as lágrimas, de duas horas à frente, abundarão no rosto).
E, como todos os que se amam
e disso, do que são, não podem fugir,
despir-nos-emos à pressa no lábio mordido
e faremos a nossa festa no virar de costas,
o instante ainda por ser, o
nosso dever cumprido.
Cumpra-se a nossa vontade, amor.
(Conceição Sousa)
*
sei que não diremos uma palavra
(e, no entanto, no silêncio, não deixaremos de nos mandar calar),
fingiremos não nos ver
(embora impedidos de nos desviar o olhar),
mas o sorriso estará lá, bem à vista de todos, subtil nos cantos
(contudo as lágrimas, de duas horas à frente, abundarão no rosto).
E, como todos os que se amam
e disso, do que são, não podem fugir,
despir-nos-emos à pressa no lábio mordido
e faremos a nossa festa no virar de costas,
o instante ainda por ser, o
nosso dever cumprido.
Cumpra-se a nossa vontade, amor.
(Conceição Sousa)
*
ninho
Só porque acredito que, lá, algures em mim mesma,
num sítio que não consigo definir,
me velas e fazes velar.
Às vezes creio-te aqui, entre as costelas, o pulmão e o coração, no peito,
à espécie de uma mola a comprimir e a comprimir;
há alturas em que te atravessas na garganta, mais ou menos a meio,
e inchas como uma bola de neve, o ar não entra e a voz não sai,
ou expandes-te como um incêndio e as carótidas quase rebentam;
também já te senti nas pernas, ali pelos lados das canelas,
uma dor fininha que me tira a força e faz vergar os joelhos;
ou por toda a pele, quando se eriça,
aí acho que te alastras que nem um vírus ou uma bomba nuclear;
mas quando bates na nuca, que nem uma tacada de golfe,
a seguir a um arrepio pela coluna acima,
uma corrente de ar num corredor a quem não vedaram o acesso,
meu Deus!, aí tenho a certeza...
Viajas por toda eu, depressa ou devagar,
não tens poiso certo, mas conheço cada esquina onde te encostas;
mingas até ao tamanho de uma pontada de agulha que espeta e escarafuncha,
minto, até ao tamanho do vazio quando te evaporas e me sei anestesiada;
estendes-te, inundação, por todos os poros que consegues ocupar
e em todas as fendas te derramas, sem que nada te consiga parar;
penetras no âmago dos ossos, não há dureza que te impeça a entrada,
se tens de ir, num passe de mágica, lá mostras a tua espada
e quebras o ritmo de quem te traz no andar.
E só por te saber, mesmo sem te ver, continuo neste caminho,
a confortar quem, nas minhas palavras, procura o aconchego de um ninho.
(Conceição Sousa)
*
num sítio que não consigo definir,
me velas e fazes velar.
Às vezes creio-te aqui, entre as costelas, o pulmão e o coração, no peito,
à espécie de uma mola a comprimir e a comprimir;
há alturas em que te atravessas na garganta, mais ou menos a meio,
e inchas como uma bola de neve, o ar não entra e a voz não sai,
ou expandes-te como um incêndio e as carótidas quase rebentam;
também já te senti nas pernas, ali pelos lados das canelas,
uma dor fininha que me tira a força e faz vergar os joelhos;
ou por toda a pele, quando se eriça,
aí acho que te alastras que nem um vírus ou uma bomba nuclear;
mas quando bates na nuca, que nem uma tacada de golfe,
a seguir a um arrepio pela coluna acima,
uma corrente de ar num corredor a quem não vedaram o acesso,
meu Deus!, aí tenho a certeza...
Viajas por toda eu, depressa ou devagar,
não tens poiso certo, mas conheço cada esquina onde te encostas;
mingas até ao tamanho de uma pontada de agulha que espeta e escarafuncha,
minto, até ao tamanho do vazio quando te evaporas e me sei anestesiada;
estendes-te, inundação, por todos os poros que consegues ocupar
e em todas as fendas te derramas, sem que nada te consiga parar;
penetras no âmago dos ossos, não há dureza que te impeça a entrada,
se tens de ir, num passe de mágica, lá mostras a tua espada
e quebras o ritmo de quem te traz no andar.
E só por te saber, mesmo sem te ver, continuo neste caminho,
a confortar quem, nas minhas palavras, procura o aconchego de um ninho.
(Conceição Sousa)
*
conto de fadas
Prometeste-me um conto de fadas, sim,
o conto de fadas que me ensinaram a sonhar,
desde que as tranças da Rapunzel roubaram o brasão dourado de mim,
o conto de fadas que me ensinaram a sonhar,
desde que as tranças da Rapunzel roubaram o brasão dourado de mim,
no meu primeiro soletrar,
desde que a Branca de Neve me fez perguntar ao espelho
desde que a Branca de Neve me fez perguntar ao espelho
se as espigas de milho, nascidas em pleno estio,
também tinham um príncipe para as salvar.
O cavalo branco? Não, não era importante.
O cavalo branco? Não, não era importante.
Mas sempre me achei feia,
só porque os meus cachos eram como os das uvas,
mas não da cor das trevas.
Embriagaste-me na utopia dos felizes para sempre -
Embriagaste-me na utopia dos felizes para sempre -
e nem te pedi que me resga(s)tasses ao instante só meu,
ao cru instinto,
ao primeiro sopro, no precipício do ventre.
Quem precisa de príncipes
quando conhece o calor da origem,
o saber da água a escaldar,
na gestação do amar?
( Conceição Sousa )
( Conceição Sousa )
*
a janela
De cada vez que amanhece,
entras assim , quentinho e claro,
por mim adentro, feixe de luz,
diálogo com o tempo.
Dizes-me
Dizes-me
"De que te queixas, afinal?
Não te sou óbvio?
Onde houver uma janela,
há dois alguéns que se vivem através dela.
E,embora penses o contrário,
o alcance de maior visão está do lado de dentro,
do escuro para a limpidez do alvorescer.
Quero chegar até ti, meu amor,
mas tens de abrir as portadas.
Daqui, consigo te iluminar,
consigo te aquecer,
mas vejo tudo escuro.
Preciso de entrar
para que te possa tocar e ver. "
( Conceição Sousa )
*
( Conceição Sousa )
*
éden
Naquele jardim onde nos despimos
tocaste-me a harpa dos ventos que bradam
suaste-me a chuva das mágoas sem pele
gemeste-me a ausência de flores nas catacumbas a pedir céu
semeaste o fim sem início nos ramos que amparam as monções.
Naquele jardim onde nos encontrámos sem medo
baptizaste a hera contagiante de nós
a praga dos amantes malditos nos braços da fauna carnívora
mas abençoados pelas raízes seculares das moléculas pagãs.
E o éden ainda não nos expulsou.
( Conceição Sousa )
tocaste-me a harpa dos ventos que bradam
suaste-me a chuva das mágoas sem pele
gemeste-me a ausência de flores nas catacumbas a pedir céu
semeaste o fim sem início nos ramos que amparam as monções.
Naquele jardim onde nos encontrámos sem medo
baptizaste a hera contagiante de nós
a praga dos amantes malditos nos braços da fauna carnívora
mas abençoados pelas raízes seculares das moléculas pagãs.
E o éden ainda não nos expulsou.
( Conceição Sousa )
*
amor cósmico?
Ouvi dizer que um amor cósmico nos arrebataria desta depressão colectiva,
um amor cósmico lançaria para o vácuo esta crise encomendada pela informação privilegiada bem à vista nos colarinhos brancos dos operários da Golden Sachs. Ouvi dizer que esse amor cósmico arrebataria todos, até mesmo os devotos do grande capital que ainda congeminam nas bancadas da maioria no Parlamento. Ouvi dizer que a era de programas eleitorais de burlões caçadores de votos terminou, e que quem assim se pensa legitimado pela democracia assistirá diariamente a eclipses solares. Ouvi dizer que esse amor cósmico se aproxima à velocidade das partículas divinas. Não? Sempre esteve connosco? Agora que dói estamos a acordar para ele. Ah! O amor ao próximo? Tem sido có(s)mico, sim.
(Conceição Sousa in "Folhetim do Português Sem Sopa, Mas Ainda Com Boca.")
um amor cósmico lançaria para o vácuo esta crise encomendada pela informação privilegiada bem à vista nos colarinhos brancos dos operários da Golden Sachs. Ouvi dizer que esse amor cósmico arrebataria todos, até mesmo os devotos do grande capital que ainda congeminam nas bancadas da maioria no Parlamento. Ouvi dizer que a era de programas eleitorais de burlões caçadores de votos terminou, e que quem assim se pensa legitimado pela democracia assistirá diariamente a eclipses solares. Ouvi dizer que esse amor cósmico se aproxima à velocidade das partículas divinas. Não? Sempre esteve connosco? Agora que dói estamos a acordar para ele. Ah! O amor ao próximo? Tem sido có(s)mico, sim.
(Conceição Sousa in "Folhetim do Português Sem Sopa, Mas Ainda Com Boca.")
instante de mágoa
Conheço-te bem, instante de mágoa,
lavas-me o rosto e as mãos em água rebelde,
a lágrima fria da melancolia
que me arrasta para o fundo
quando não o quero.
Conheço-te bem, instante de mágoa,
vens sem eu pedir,
e vais porque te mato
antes de que me mates a mim.
Ganhei, mais uma vez.
(Conceição Sousa)
*
lavas-me o rosto e as mãos em água rebelde,
a lágrima fria da melancolia
que me arrasta para o fundo
quando não o quero.
Conheço-te bem, instante de mágoa,
vens sem eu pedir,
e vais porque te mato
antes de que me mates a mim.
Ganhei, mais uma vez.
(Conceição Sousa)
*
quarta-feira, 23 de janeiro de 2013
açaime
Deus está impedido de falar,
tem um açaime que lhe cobre o rosto,
para que, com a força das suas palavras,
não varra a existência dos que vivem no agora.
E ela, que já foi humana, a sua amante,
naquele fluído que se libertou do corpo morto,
ainda energia condensada,
ainda com formas de mundo terno,
toca-lhe ao de leve na solidão do rosto,
e beija-o,
deixando-se estar,
naquela fracção de segundo
em que o consegue afagar.
Deus, que, por instantes, deixou de se sentir só,
não tira o açaime,
mas recosta-se nos lábios dela -
os que lhe sentem a humidade salgada
a escorrer no arrepio quente do até ali desamparado desgosto -
e agradece-lhe a humanidade que traz consigo,
e que, antes de partir para o vácuo,
lhe segreda o amor dos homens e das mulheres
na nódoa mordida
a alastrar no seu pescoço.
(Conceição Sousa)
tem um açaime que lhe cobre o rosto,
para que, com a força das suas palavras,
não varra a existência dos que vivem no agora.
E ela, que já foi humana, a sua amante,
naquele fluído que se libertou do corpo morto,
ainda energia condensada,
ainda com formas de mundo terno,
toca-lhe ao de leve na solidão do rosto,
e beija-o,
deixando-se estar,
naquela fracção de segundo
em que o consegue afagar.
Deus, que, por instantes, deixou de se sentir só,
não tira o açaime,
mas recosta-se nos lábios dela -
os que lhe sentem a humidade salgada
a escorrer no arrepio quente do até ali desamparado desgosto -
e agradece-lhe a humanidade que traz consigo,
e que, antes de partir para o vácuo,
lhe segreda o amor dos homens e das mulheres
na nódoa mordida
a alastrar no seu pescoço.
(Conceição Sousa)
VIDA
Que os teus olhos saibam agradecer a luz do dia,
que o teu descanso se entregue grato à escuridão da noite,
que os teus ouvidos se encantem,de todas as vezes, com os ruídos da natureza,
que as fragrâncias do mundo te despertem para o amor a ti,
e a todos os que te querem bem,
que a tua pele perceba o toque quente do sol
e o baptismo sazonal da chuva ( o início da saudade),
pois, de todas as vezes, te dizem :
ainda estás,
ainda PODES,
ainda és: VIDA.
Conceição Sousa
que o teu descanso se entregue grato à escuridão da noite,
que os teus ouvidos se encantem,de todas as vezes, com os ruídos da natureza,
que as fragrâncias do mundo te despertem para o amor a ti,
e a todos os que te querem bem,
que a tua pele perceba o toque quente do sol
e o baptismo sazonal da chuva ( o início da saudade),
pois, de todas as vezes, te dizem :
ainda estás,
ainda PODES,
ainda és: VIDA.
Conceição Sousa
Perdoar?
Perdoar?...
Até perdoo.
Impossível mesmo é voltar a te amar.
Qualquer abraço teu,
levará os meus olhos junto -
e eles dir-me-ão que não é a mim que tuas mãos enlaçam.
Qualquer beijo teu,
soprará ao meu ouvido o instante que nunca foi meu.
Há uma fenda inesgotável de dor na estima que me roubaste.
Quiseste o meu amor,
mas foi a ela que o entregaste.
Não te amo.
Ninguém consegue amar quem quebra um elo
com uma ela.
E já nem ferida é -
apenas impossibilidade.
(Conceição Sousa)
*
Até perdoo.
Impossível mesmo é voltar a te amar.
Qualquer abraço teu,
levará os meus olhos junto -
e eles dir-me-ão que não é a mim que tuas mãos enlaçam.
Qualquer beijo teu,
soprará ao meu ouvido o instante que nunca foi meu.
Há uma fenda inesgotável de dor na estima que me roubaste.
Quiseste o meu amor,
mas foi a ela que o entregaste.
Não te amo.
Ninguém consegue amar quem quebra um elo
com uma ela.
E já nem ferida é -
apenas impossibilidade.
(Conceição Sousa)
*
sem resposta
Por isso é melhor que nunca perguntes
o que sabes não ter resposta.
E o silêncio torna-se na voz mais genuína,
no trajecto mais próximo da crua verdade:
isto que constantemente passa de mim para ti e de ti para mim.
Não digas. Antes de o dizeres já cá chegou. Sei.
Não, não digo. Sabes.
(Conceição Sousa)
*
o que sabes não ter resposta.
E o silêncio torna-se na voz mais genuína,
no trajecto mais próximo da crua verdade:
isto que constantemente passa de mim para ti e de ti para mim.
Não digas. Antes de o dizeres já cá chegou. Sei.
Não, não digo. Sabes.
(Conceição Sousa)
*
Espantados
Trago-te, dentro de mim, uma vida inteira.
Lembro-me até de ter desistido de te procurar.
Cheguei mesmo a pensar que não passavas de um outro eu,
alguém que idealizei dentro de mim, igual a mim.
Mas eis que a vida me surpreende e te encontro no lado de fora.
Impossível, pensei.
E aquela frase de José Gomes Ferreira em " Aventuras de João Sem Medo" não me sai da cabeça:
" Proibida a entrada a quem não andar espantado de existir."
Pois bem, espantei-me e espantei-te - espantámo-nos.
Agora, sabendo exactamente onde estamos, dentro um do outro,
nenhum consegue estar mais distante do que a própria distância.
Aqui, no âmago de ti. Aí, no âmago de mim. Impossível, oh!
(Conceição Sousa)
*
Lembro-me até de ter desistido de te procurar.
Cheguei mesmo a pensar que não passavas de um outro eu,
alguém que idealizei dentro de mim, igual a mim.
Mas eis que a vida me surpreende e te encontro no lado de fora.
Impossível, pensei.
E aquela frase de José Gomes Ferreira em " Aventuras de João Sem Medo" não me sai da cabeça:
" Proibida a entrada a quem não andar espantado de existir."
Pois bem, espantei-me e espantei-te - espantámo-nos.
Agora, sabendo exactamente onde estamos, dentro um do outro,
nenhum consegue estar mais distante do que a própria distância.
Aqui, no âmago de ti. Aí, no âmago de mim. Impossível, oh!
(Conceição Sousa)
*
época
E a época será minha
enquanto me cobrir de pele
e a força do sangue alimentar a minha carne
e a minha alma.
Aos meus ossos ajoelho a minha prece
para que me mantenham de pé
e consiga fazer jus ao meu nascimento.
Por muito que outros entendam
que têm voz na matéria da minha existência,
eu digo:
" Não.
Não, ainda não é hora de eu morrer.
E não és tu que decides o que vim ao mundo fazer."
(Conceição Sousa)
*
enquanto me cobrir de pele
e a força do sangue alimentar a minha carne
e a minha alma.
Aos meus ossos ajoelho a minha prece
para que me mantenham de pé
e consiga fazer jus ao meu nascimento.
Por muito que outros entendam
que têm voz na matéria da minha existência,
eu digo:
" Não.
Não, ainda não é hora de eu morrer.
E não és tu que decides o que vim ao mundo fazer."
(Conceição Sousa)
*
sorriso
Não fique triste, nem se sinta uma pessoa menor, porque, com toda a certeza, num momento qualquer do dia, haverá alguém que, sem o saber, aguarda a sua palavra e o seu sorriso para que possa continuar até ao anoitecer.
(Conceição Sousa)
(Conceição Sousa)
sexta-feira, 18 de janeiro de 2013
Rasguei
Rasguei tudo o que de ti veio,
os livros, os jornais, os emails, os uis e os ais.
Queimei tudo, em lume brando,
e fiquei ali,
de olhos secos e especados e lábios cerrados
a ver as cinzas subir;
e fiquei ali,
a sentir o negrume a entrar,
a vida que não me quis a ir.
Rasguei e queimei tudo o que de ti veio,
senti o teu coração a estilhaçar-se
e o fogo no teu olhar a consumir-me.
Rasguei-me e queimei-me no mundo
só para que sentisses
a tua mão no crepúsculo do meu cabelo rubro a esvair-se.
Uma fagulha de fricção leve,
dois incêndios em leitos de torrentes imparáveis,
margens apostas nas vidraças boreais:
o arco-íris só para os demais.
Falto eu
para que nada de ti sobre.
Falto eu, rasgo e labareda,
o beco sem saída da pobre.
os livros, os jornais, os emails, os uis e os ais.
Queimei tudo, em lume brando,
e fiquei ali,
de olhos secos e especados e lábios cerrados
a ver as cinzas subir;
e fiquei ali,
a sentir o negrume a entrar,
a vida que não me quis a ir.
Rasguei e queimei tudo o que de ti veio,
senti o teu coração a estilhaçar-se
e o fogo no teu olhar a consumir-me.
Rasguei-me e queimei-me no mundo
só para que sentisses
a tua mão no crepúsculo do meu cabelo rubro a esvair-se.
Uma fagulha de fricção leve,
dois incêndios em leitos de torrentes imparáveis,
margens apostas nas vidraças boreais:
o arco-íris só para os demais.
Falto eu
para que nada de ti sobre.
Falto eu, rasgo e labareda,
o beco sem saída da pobre.
(Conceição Sousa)
*
borboleta
A borboleta nas costas da minha mãe.
A que arrepiou, com a sua entrega, com a entrega de uma vida,
caminho para mim.
Obrigada pela tua dedicação, mãe.
O amor tem cara,
reveste-se de pele,
entranha-se na alma pela voz do corpo,
sangra quando é ferido,
sustem-se na firmeza dos ossos,
retém-se na clareza da água em cada olhar,
abraça a vida em cada silêncio,
em cada timbre amordaçado,
em cada esgar de cuidado.
O amor transpira na pele de umas costas largas ( bem largas)
o voo de uma borboleta de dupla cor:
o negro da noite e o laranja do amanhecer.
O amor é sinal divino e traz mensagem de luz
na escuridão de quem se pensa obliviado.
E, sim, o Acaso não dorme.
Ao Ocaso segue-se sempre uma Aurora.
Desperta para mim, amor.
( Conceição Sousa)
*
A que arrepiou, com a sua entrega, com a entrega de uma vida,
caminho para mim.
Obrigada pela tua dedicação, mãe.
O amor tem cara,
reveste-se de pele,
entranha-se na alma pela voz do corpo,
sangra quando é ferido,
sustem-se na firmeza dos ossos,
retém-se na clareza da água em cada olhar,
abraça a vida em cada silêncio,
em cada timbre amordaçado,
em cada esgar de cuidado.
O amor transpira na pele de umas costas largas ( bem largas)
o voo de uma borboleta de dupla cor:
o negro da noite e o laranja do amanhecer.
O amor é sinal divino e traz mensagem de luz
na escuridão de quem se pensa obliviado.
E, sim, o Acaso não dorme.
Ao Ocaso segue-se sempre uma Aurora.
Desperta para mim, amor.
( Conceição Sousa)
*
tentações
As tentações tentam-nos. Compete-nos fugir-lhes, fingir ignorá-las - ou ao destino não esburacar uma brecha tal que permita a sua infiltração. Também podemos ser bafejados pela sorte e a tentação não nos achar lá grande tentação. Ah!, obrigada meu Deus! Não foi bem "não nos deixes cair em tentação", foi mais "não deixes que o olhar da tentação caia em cima de nós". Ufa!, problema resolvido.
(Conceição Sousa)
(Conceição Sousa)
Abrir de cortina
Fazemos assim:
deixamos passar o tempo,
conversamos,
vamos entregando aos poucos quem somos.
Tudo o que é desconhecido
suscita em nós uma envolvência de mistério.
Ao fim de uns encontros ,
de umas palavras,
de um abrir de cortina,
não sobrará réstia de paixão.
Talvez apenas uma boa amizade.
E saímos todos a ganhar.
Nós e as nossas famílias.
Abraço.
( Conceição Sousa)
deixamos passar o tempo,
conversamos,
vamos entregando aos poucos quem somos.
Tudo o que é desconhecido
suscita em nós uma envolvência de mistério.
Ao fim de uns encontros ,
de umas palavras,
de um abrir de cortina,
não sobrará réstia de paixão.
Talvez apenas uma boa amizade.
E saímos todos a ganhar.
Nós e as nossas famílias.
Abraço.
( Conceição Sousa)
Peregrinos
Ela nunca foi uma desistente.
Procura outras vias,
vai por outros caminhos,
descansa na berma da estrada,
às vezes esconde-se na alegoria das cavernas,
mas regressa sempre à lama
e chapinha as vezes que forem necessárias.
Embora suja, molhada e suada,
sente-se completa
e faz-se eleita de entre os que se fazem eleitos.
O sorriso nunca falha.
Acompanha, de bom grado,
o cansaço, o desespero, as lágrimas e a dor.
Vamos lá,
no caminho há-de haver sempre um tempinho
para acarinharmos os pés.
Força, peregrinos.
(Conceição Sousa)
Procura outras vias,
vai por outros caminhos,
descansa na berma da estrada,
às vezes esconde-se na alegoria das cavernas,
mas regressa sempre à lama
e chapinha as vezes que forem necessárias.
Embora suja, molhada e suada,
sente-se completa
e faz-se eleita de entre os que se fazem eleitos.
O sorriso nunca falha.
Acompanha, de bom grado,
o cansaço, o desespero, as lágrimas e a dor.
Vamos lá,
no caminho há-de haver sempre um tempinho
para acarinharmos os pés.
Força, peregrinos.
(Conceição Sousa)
quarta-feira, 16 de janeiro de 2013
alicerces
Derrubaram-nos os alicerces, a casa ruiu. Agora, deambulamos por aqui e por ali, sem rumo certo, sem sequer ter a esperança de encontrar um lugar onde erigir de novo um possível...( até da palavra temos medo...) sonho. A única certeza que temos é a de que há um vazio de critérios. Os válidos deixaram de existir. Todas as conquistas foram apagadas. Roubaram-nos a projecção de um futuro. Percorremos um terreno pantanoso. Ninguém sabe o que o próximo passo trará - e já ninguém quer saber. A Democracia perdeu-se das suas bases - deixou de o ser. Todos acordam e sabem que deixaram de acreditar.
A magia acontecerá no momento em que o povo vir a justiça a tirar a venda e a colocá-la nos pulsos dos que nos usurparam a vida. "Só aí poderemos voltar a acreditar", dizem.
(Conceição Sousa in " Folhetim do Português Sem Sopa, Mas Ainda Com Boca")
A magia acontecerá no momento em que o povo vir a justiça a tirar a venda e a colocá-la nos pulsos dos que nos usurparam a vida. "Só aí poderemos voltar a acreditar", dizem.
(Conceição Sousa in " Folhetim do Português Sem Sopa, Mas Ainda Com Boca")
picos
O que fica não são os picos,
nem sequer os extremos,
os altos ou os baixos,
os céus ou os infernos.
O que fica são os meridianos,
os consistentes,
os rame-rames,
as formiguinhas,
os que estão ali,
nas suas pequenas rotinas,
todos os dias,
dê por onde der,
uns para os outros.
Amo, de paixão, as pessoas que insistem em continuar a ser pessoas de bem.
(Conceição Sousa)
nem sequer os extremos,
os altos ou os baixos,
os céus ou os infernos.
O que fica são os meridianos,
os consistentes,
os rame-rames,
as formiguinhas,
os que estão ali,
nas suas pequenas rotinas,
todos os dias,
dê por onde der,
uns para os outros.
Amo, de paixão, as pessoas que insistem em continuar a ser pessoas de bem.
(Conceição Sousa)
in love
Às vezes, no amor, precisamos de calar, precisamos de chorar, precisamos de saber que estamos sós, precisamos de o aceitar (o outro será sempre o outro). E só depois nos encontramos - de mão dada com a visita que de vez em quando vem, a dor - preparados para amar.
(Conceição Sousa)
Sometimes, in love, we need to be quiet, we need to cry, we need to know that we are alone, we need to accept it ( the other will always be the other). And only then we meet - hand in hand with the visit that comes from time to time, the pain - ready to love.
(Conceição Sousa)
(Conceição Sousa)
Sometimes, in love, we need to be quiet, we need to cry, we need to know that we are alone, we need to accept it ( the other will always be the other). And only then we meet - hand in hand with the visit that comes from time to time, the pain - ready to love.
(Conceição Sousa)
loosened ends: us
I'd like to be day not night
and that you'd dream of me as a spring
the everlasting flow
which absent from me sprouts
and covers you inhaling
our cutting breath.
(Conceição Sousa in "loosened ends: us", 2011)
and that you'd dream of me as a spring
the everlasting flow
which absent from me sprouts
and covers you inhaling
our cutting breath.
(Conceição Sousa in "loosened ends: us", 2011)
domingo, 13 de janeiro de 2013
só
Ela queria apenas uma pessoa que a quisesse e soubesse cuidar,
assim como ela quis e soube cuidar de centenas delas
em toda a sua vida -
que ainda não era assim tão longa quanto isso.
Ela queria apenas sentir,
nem que fosse uma única vez,
o outro lado,
o lado de quem é querido
e cuidado por alguém
que simplesmente está atento e quer querer e cuidar,
e sabe querer e cuidar.
É triste alguém que dá tanto não saber receber.
Pedir?
Sim, até esse ponto ela sabe ir: pedir.
A parte do receber é que é mais estranha.
Há algo nela que tem impedido o que vem de fora de entrar.
E sofre, e chora, e dói -
e já nem sofre, nem chora, nem dói.
Adaptou-se e aceitou.
É assim, ninguém com ninguém dentro.
Mas um dia sonhou que seria alguém.
E foi.
Durante muito tempo foi alguém desesperadamente só.
(Conceição Sousa)
assim como ela quis e soube cuidar de centenas delas
em toda a sua vida -
que ainda não era assim tão longa quanto isso.
Ela queria apenas sentir,
nem que fosse uma única vez,
o outro lado,
o lado de quem é querido
e cuidado por alguém
que simplesmente está atento e quer querer e cuidar,
e sabe querer e cuidar.
É triste alguém que dá tanto não saber receber.
Pedir?
Sim, até esse ponto ela sabe ir: pedir.
A parte do receber é que é mais estranha.
Há algo nela que tem impedido o que vem de fora de entrar.
E sofre, e chora, e dói -
e já nem sofre, nem chora, nem dói.
Adaptou-se e aceitou.
É assim, ninguém com ninguém dentro.
Mas um dia sonhou que seria alguém.
E foi.
Durante muito tempo foi alguém desesperadamente só.
(Conceição Sousa)
despedida
É muito difícil despedirmo-nos de alguém
a quem muito amamos.
Aquele adeus,
aquele frágil aceno de mão,
aquela derradeira lágrima
que desliza na pele que sempre a acolheu,
convida-nos a não retirar os lábios trémulos
e perdidos da tez que esfria,
convida-nos a fazer a viagem,
num abraço interminável.
Não, não mo tirem dos braços,
não, não mo tirem dos braços
este corpo que tão bem conheço,
não, voltamos atrás no tempo,
não me tirem a minha infância,
não, por favor, não!
Leva-me contigo,
por favor, leva-me contigo.
Onde estás?
Onde estás?
Qual delas é?
Qual delas é, a tua partícula de luz, meu amor?
(Conceição Sousa)
a quem muito amamos.
Aquele adeus,
aquele frágil aceno de mão,
aquela derradeira lágrima
que desliza na pele que sempre a acolheu,
convida-nos a não retirar os lábios trémulos
e perdidos da tez que esfria,
convida-nos a fazer a viagem,
num abraço interminável.
Não, não mo tirem dos braços,
não, não mo tirem dos braços
este corpo que tão bem conheço,
não, voltamos atrás no tempo,
não me tirem a minha infância,
não, por favor, não!
Leva-me contigo,
por favor, leva-me contigo.
Onde estás?
Onde estás?
Qual delas é?
Qual delas é, a tua partícula de luz, meu amor?
(Conceição Sousa)
penas
A menina, que conhecia o mundo ia p'ra 9 anos, carregava, como de costume, nas duas mãos, duas sacas bem pesadas de mantimentos, que trazia da mercearia do bairro onde a avó morava. Lá, a D. Josefa, deixava pagar fiado - e a avó, quando recebia a reforma, abatia a conta que alimentava os netos. Ainda eram cerca de dois km até casa, e as sacas pesavam nas articulações dos ombros, mas tinha de andar, os irmãos precisavam de comer. Então - lembra-se -, dava por si a fazer fintas à mente " Imagina que o que trazes nas duas mãos são duas penas de galinha muito leves, levezinhas, e que vais a brincar com elas. És uma bailarina do Lago dos Cisnes, e danças em bicos de pés. Dentro de umas sabrinas de algodão doce, deslizas, em pleno Inverno, no reflexo envidraçado do lago, onde vês muitas penas a esvoaçar." Sem saber como, chegava a casa e nem se apercebia do peso que havia carregado, nem das paisagens que havia visto pelo caminho, nem das pessoas com quem tinha falado, nem sequer do tempo que tinha passado. Só quando pousava as sacas, as dores nas costas lhe diziam "É aqui a realidade. Voltaste."
(Conceição Sousa)
(Conceição Sousa)
perdas
Quando fazemos uma determinada escolha, devemos perguntar-nos, uns segundos antes, o que estamos dispostos a perder. Eu fiz a minha, tu fizeste a tua - e sofremos as inevitáveis perdas. Sei bem o que me espera, não te preocupes, mas esta é a minha escolha.
(Conceição Sousa in "Folhetim do Português Sem Sopa, Mas Ainda Com Boca")
(Conceição Sousa in "Folhetim do Português Sem Sopa, Mas Ainda Com Boca")
belo e rico?
E acredita no teu valor. Porque és belo, sim. Porque és rico, sim.
E se há quem não te veja não é porque o teu valor não o seja - é, simplesmente, porque no outro não o há: valor. Logo, não te sabe ver.
E, por esse facto, o que tu és ( belo e rico) não deixa de o ser.
Entristece-te apenas pelo que o outro não quer ganhar - mas não muito tempo.
Esse, que não te sabe ver ou ganhar, é dos que te fariam empobrecer.
Acredita: estás bem melhor assim, a não te saberem ver, imune ao olho gigante que não se abate sobre ti.
(Conceição Sousa)
E se há quem não te veja não é porque o teu valor não o seja - é, simplesmente, porque no outro não o há: valor. Logo, não te sabe ver.
E, por esse facto, o que tu és ( belo e rico) não deixa de o ser.
Entristece-te apenas pelo que o outro não quer ganhar - mas não muito tempo.
Esse, que não te sabe ver ou ganhar, é dos que te fariam empobrecer.
Acredita: estás bem melhor assim, a não te saberem ver, imune ao olho gigante que não se abate sobre ti.
(Conceição Sousa)
argumentação
Sabes, amigo, numa argumentação há-de chegar uma altura em que alguém se torna imprudente, violento ( é normal - e se calhar até à vez...) e, aí, convém que um dos dois consiga projectar o futuro de tais actos, lançar todos os sentidos para uns minutos, umas horas, uns dias, uns meses, mais à frente. Reter-se nessa projecção uns segundos e retornar ao ponto de partida. Nesse instante, chega a sensatez de um silêncio, de um suposto ámen, o que se chama a coragem de uma breve trégua para dar tempo ao outro lado de se projectar mais adiante. Começou agora o teu tempo. Aguardo.
(Conceição Sousa)
(Conceição Sousa)
boas
As pessoas que fazem por proporcionar, em cada instante da sua vida, bons momentos a si próprias e aos outros nunca morrem - mesmo que, como qualquer ser humano, tenham cometido alguns erros e , nesses instantes, tenham sido más pessoas. Poderemos então denominar estas pessoas de boas pessoas e dizer: as boas pessoas nunca morrem.
(Conceição Sousa)
(Conceição Sousa)
inimigos?
Não tenho inimigos. Tenho pessoas que me magoaram e que, sei, não me querem na sua vida. Por isso finjo ignorá-las. Se é melhor p'ra elas, é melhor p'ra mim.
(Conceição Sousa)
(Conceição Sousa)
calar ?
Não me peças para calar, porque se calar é como se tivesse morrido e não o soubesse. É como se tivesse morrido, continuasse a acordar todos os dias, a caminhar todos os dias, a adormecer todos os dias, e não o soubesse - que tinha morrido. Não me peças para calar, porque calar é o mesmo que pedir para nunca ter nascido. A vida é para ser cumprida.
(Conceição Sousa in " Folhetim do Português Sem Sopa, Mas Ainda Com Boca")
(Conceição Sousa in " Folhetim do Português Sem Sopa, Mas Ainda Com Boca")
sábado, 12 de janeiro de 2013
cacho doirado
Disseste que te apaixonaste primeiro pelos meus longos cabelos aos cachos doirados,
e amaste-me como ninguém,
na presença de uma ausência constante de tudo em redor.
Por isso, quando senti que nunca havias estado, cortei-os.
Não queria correr o risco de voltares.
Sem eles, tinha a certeza de que não me amarias.
Embora te saiba capaz de te apaixonares em segundo pelos meus olhos.
Já sei. Sempre que passar por ti, fecho-os.
Aí vejo-te eu a ti, mas tu não me verás a mim.
(Conceição Sousa)
e amaste-me como ninguém,
na presença de uma ausência constante de tudo em redor.
Por isso, quando senti que nunca havias estado, cortei-os.
Não queria correr o risco de voltares.
Sem eles, tinha a certeza de que não me amarias.
Embora te saiba capaz de te apaixonares em segundo pelos meus olhos.
Já sei. Sempre que passar por ti, fecho-os.
Aí vejo-te eu a ti, mas tu não me verás a mim.
(Conceição Sousa)
sábado, 5 de janeiro de 2013
partilho
Partilho à medida das minhas possibilidades, no meu pequeno núcleo de familiares e amigos. Acreditem que, se não me fizesse falta, e se tivesse disponibilidade financeira, investiria ainda mais na publicação dos meus sentimentos e reflexões e distribuiria os exemplares por ainda mais amigos. Acredito, sinceramente, que ao fazê-lo, estou a contribuir para o bem comum e para um mundo melhor para todos nós, mas em especial para os meus filhos e alunos.
(Conceição Sousa)
(Conceição Sousa)
pequenas pessoas
São as pequenas pessoas, como eu e tu, que, no seu dia-a-dia, nas suas pequenas rotinas, ao interagir com as rotinas de outras pequenas pessoas, como eu e tu, fazem com que a vida seja um lugar acolhedor e apetecível. Obrigada por serem quem são e me ajudarem a ser quem sou.
(Conceição Sousa)
(Conceição Sousa)
rica?
Nunca serei uma pessoa rica ( no sentido comum da palavra), pelo simples motivo de que o dinheiro para mim não é um fim em si mesmo, mas sim apenas mais um instrumento para chegar ao bem comum. Costumo dizer em casa que não sei viver com mais dinheiro do que aquele de que preciso. Se sobra um pouco mais, é , de imediato, distribuido. E sou muito feliz assim, a permitir que outros sejam felizes. Tenho a sorte de me rodear de gente que pensa e sente de igual forma, por isso, quando há algo de que preciso e não há dinheiro, há sempre alguém ( a quem ele sobra) que mo faz chegar à mão. E esta urgência e necessidade de sorrirmos ao contribuirmos para a tranquilidade de uma comunidade e pelo bem-comum, é o que nos faz falta, principalmente a quem detém o poder.
(Conceição Sousa)
(Conceição Sousa)
pessoas feias
Incomodam-me as pessoas feias: as que insistem em se manter ignorantes de sol, de lua, de chuva, de vento, de mar; as que sorriem vitoriosas perante uma maldade, um acto de incredulidade, mais uma morte da sua abençoada vida nisto que é vida (o ar, o céu, o rio, a floresta, a montanha); as que se enganam a si mesmas no faro do que não importa nada, mesmo nada, a ganância, a exuberância, os holofotes, a não modéstia; as que desprezam o olhar comiserado, a mão necessitada, o abraço carente, o beijo saudoso, a voz embargada, o sentimento a caminho da tranquilidade e da paz.
Incomodam-me as pessoas feias: as que não percebem que para além do florescer da Primavera e do sereno abandonar do Outono, também a ardência do Verão e a frigidez do Inverno assaltam a alma - e , nesses momentos, comuns a todo o humano, carecem da solidão a que desertaram todos os que não serviam; as que não sentem no ciclo das estações saudades do que virá e o comum de uma geada no peito de todos nós a cobrir-se do sorriso de um amanhecer soalheiro que nos relembra quem somos: apenas humanos.
(Conceição Sousa)
Incomodam-me as pessoas feias: as que não percebem que para além do florescer da Primavera e do sereno abandonar do Outono, também a ardência do Verão e a frigidez do Inverno assaltam a alma - e , nesses momentos, comuns a todo o humano, carecem da solidão a que desertaram todos os que não serviam; as que não sentem no ciclo das estações saudades do que virá e o comum de uma geada no peito de todos nós a cobrir-se do sorriso de um amanhecer soalheiro que nos relembra quem somos: apenas humanos.
(Conceição Sousa)
sexta-feira, 4 de janeiro de 2013
De cada vez que estendes a mão,
de cada vez que dás um sorriso,
de cada vez que envolves alguém num abraço,
estás a caminhar na direcção de ti mesmo.
E esse é o segredo: a felicidade.
De cada vez que te recusas a fazê-lo,
estás a negá-lo: ao teu sorriso,
dentro da mão que te envolve num abraço.
(Conceição Sousa)
de cada vez que dás um sorriso,
de cada vez que envolves alguém num abraço,
estás a caminhar na direcção de ti mesmo.
E esse é o segredo: a felicidade.
De cada vez que te recusas a fazê-lo,
estás a negá-lo: ao teu sorriso,
dentro da mão que te envolve num abraço.
(Conceição Sousa)
meu amor
Meu amor,
já são tantas as horas, os dias, os meses, os anos, que nos não vemos.
Recordo, com aquele carinho de quem sorri a vida,
todos os instantes de loucura, todas as travessuras equilibristas, todos os ímpetos do coração.
Sei que me escutas, sei onde estás, sei quem te guarda e balança.
As nossas vidas seguiram pelos caminhos que as escolheram.
Estamos bem - sei que sim.
Os nossos amores multiplicaram-se,
mas quero que saibas ( e sei que o sabes) que nos trago aqui:
naquele momento em que algo de especial acontece,
no acontecer da lágrima feliz, no esboçar do sorriso triste.
Meu amor, continuo a escrever-te estas cartas
porque gosto de fotografar os pequenos instantes em que conversamos,
gosto de chorar no teu ombro, de sorrir no teu abraço, de morder o teu lábio -
e ninguém tem de decidir terminar uma história.
Meu amor, mais uma vez, e com as saudades de quem sabe
que nunca mais estará na presença de quem ama, deixo-te aqui todo o meu sentir,
num laço que me segura à vida e me faz nela o deleite de existir.
Mais uma vez um ano termina e um outro me acena,
contigo bem perto, nessa distância plena de mim.
Mais uma vez, não é o fim.
Desta que em ti mora
Melancolia.
(Conceição Sousa)
*
já são tantas as horas, os dias, os meses, os anos, que nos não vemos.
Recordo, com aquele carinho de quem sorri a vida,
todos os instantes de loucura, todas as travessuras equilibristas, todos os ímpetos do coração.
Sei que me escutas, sei onde estás, sei quem te guarda e balança.
As nossas vidas seguiram pelos caminhos que as escolheram.
Estamos bem - sei que sim.
Os nossos amores multiplicaram-se,
mas quero que saibas ( e sei que o sabes) que nos trago aqui:
naquele momento em que algo de especial acontece,
no acontecer da lágrima feliz, no esboçar do sorriso triste.
Meu amor, continuo a escrever-te estas cartas
porque gosto de fotografar os pequenos instantes em que conversamos,
gosto de chorar no teu ombro, de sorrir no teu abraço, de morder o teu lábio -
e ninguém tem de decidir terminar uma história.
Meu amor, mais uma vez, e com as saudades de quem sabe
que nunca mais estará na presença de quem ama, deixo-te aqui todo o meu sentir,
num laço que me segura à vida e me faz nela o deleite de existir.
Mais uma vez um ano termina e um outro me acena,
contigo bem perto, nessa distância plena de mim.
Mais uma vez, não é o fim.
Desta que em ti mora
Melancolia.
(Conceição Sousa)
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2013
Amigos, tracei um caminho ( mais um), no início de 2010, com a criação do blog "Ecodalma". Decidi partilhar esta parte de mim, a que escreve diariamente, numa entrega incondicional a mim própria e à humanidade. Tive a ajuda de alguém muito especial, alguém que me desenlaçou da minha natural reserva e timidez, alguém que observa os meus passos com redobrada atenção, alguém a quem eu tenho o dever de mostrar que a vida ( a nossa vida - a de verdade) é para cumprir: os meus filhos. E aqui estou ( aqui estamos), a um pequeno instante de 2013. E esta é a minha maior mensagem para vocês, meus amigos: sejam aquilo que são, façam por se cumprirem em pleno na vossa vida, transmitam a quem vos rodeia e ama que o caminho da verdade é o da felicidade. Qualquer caminho dói ( não devemos temer a dor), mas dói insuportavelmente mais se não for o nosso caminho. A meu ver, uma vida plena, é aquela que se coloca pequenos objectivos, genuínas metas, e vai conseguindo, passo a passo, pequenas vitórias. No trajecto só temos de sorrir porque, bem ou mal, é o nosso trajecto. Votos de um Excelente 2013 e muito, muito, grata pela vossa companhia, pela vossa ternura, pela vossa força. "Quando um rio corre dentro de nós, é difícil segurá-lo."
as pessoas
O melhor, no mundo, são as pessoas. E não compreendo como há seres humanos que não vêem isso. O melhor, nesta breve passagem para algures, é o olhar das tuas crianças que te observam atentamente e sorriem de cada vez que lhes falas ao coração; o melhor, neste interlúdio de algo, é a palavra do amigo que te acolhe na sua vida e se mantém , ali, firme, sempre que a solidão te assalta, sempre que a alegria te faz questão de mostrar que mais nada te faz falta; o melhor, neste hiato de loucura, é o teu irmão, que te afaga a tez, ao deslizar, com a sua carinhosa mão, aquele pedaço de cabelo rebelde que insiste em te tapar a visão.
O melhor, neste mundo de agora e de todos os que me lêem ( reparem: posso até já nem estar...), escuta-me bem, são as pessoas e os laços em que se investem: o abraço que não negam, o beijo que não foge, a lágrima que não se esconde, o sorriso que não se segura, a mão que nunca desiste de se estender, seja um pedido ou doação de ti.
O melhor, no ar que se respira, são as pessoas: o amor a caminhar na direcção do outro, sem de si nunca se desgarrar.
(Conceição Sousa)
O melhor, neste mundo de agora e de todos os que me lêem ( reparem: posso até já nem estar...), escuta-me bem, são as pessoas e os laços em que se investem: o abraço que não negam, o beijo que não foge, a lágrima que não se esconde, o sorriso que não se segura, a mão que nunca desiste de se estender, seja um pedido ou doação de ti.
O melhor, no ar que se respira, são as pessoas: o amor a caminhar na direcção do outro, sem de si nunca se desgarrar.
(Conceição Sousa)
quarta-feira, 2 de janeiro de 2013
nós,mulheres
De vez em quando, nós, mulheres,
apreciamos entregar os nossos corações,
bem vermelhinhos, bem esponjosos, bem carregadinhos de sangue,
em cima de uma bandeja, e dá-los a saborear a eles,
aos que nos cegaram os olhos ( sem que o soubéssemos, claro!),
aos que nos sussurraram meias-verdades nos ouvidos habituados à surdez
(estou a ouvir? ui!, estou mesmo a ouvir? que bom, ouço! pensei que nunca mais pudesse ouvir!).
De vez em quando, nós, mulheres,
saímos dos nossos corpos e colocámo-nos, à distância de uma esquina,
a observar o suor que escorre, a saliva do deleite que parece querer esticar-se até nós,
até ao sorriso do canto que observa aquilo tudo,
que anui ao gemido a leveza do eco e permite à pele a cinza do arrepio.
De vez em quando, nós, mulheres,
deitamo-nos no canapé lânguido do tempo só para adoçar o bico à inteligência
e calcular o trajecto a que o outro se dispõe ir.
Mas pensas mesmo que ao orgasmo basta o toque do corpo?
Estás plenamente convencido de que as águas e o grito te dizem que és bom?
É que, à distância do canto de um sorriso, há uma inteligência de um calculismo calado
que te sabe aprimorado na tua esquina, a dar ordens aos fluídos e hirtos do teu estar sólido,
para que a tua matemática não te falhe e anote no papel todos os ângulos imaginados.
( Conceição Sousa )
*
apreciamos entregar os nossos corações,
bem vermelhinhos, bem esponjosos, bem carregadinhos de sangue,
em cima de uma bandeja, e dá-los a saborear a eles,
aos que nos cegaram os olhos ( sem que o soubéssemos, claro!),
aos que nos sussurraram meias-verdades nos ouvidos habituados à surdez
(estou a ouvir? ui!, estou mesmo a ouvir? que bom, ouço! pensei que nunca mais pudesse ouvir!).
De vez em quando, nós, mulheres,
saímos dos nossos corpos e colocámo-nos, à distância de uma esquina,
a observar o suor que escorre, a saliva do deleite que parece querer esticar-se até nós,
até ao sorriso do canto que observa aquilo tudo,
que anui ao gemido a leveza do eco e permite à pele a cinza do arrepio.
De vez em quando, nós, mulheres,
deitamo-nos no canapé lânguido do tempo só para adoçar o bico à inteligência
e calcular o trajecto a que o outro se dispõe ir.
Mas pensas mesmo que ao orgasmo basta o toque do corpo?
Estás plenamente convencido de que as águas e o grito te dizem que és bom?
É que, à distância do canto de um sorriso, há uma inteligência de um calculismo calado
que te sabe aprimorado na tua esquina, a dar ordens aos fluídos e hirtos do teu estar sólido,
para que a tua matemática não te falhe e anote no papel todos os ângulos imaginados.
( Conceição Sousa )
*
ervilha
Tenho por hábito reter apenas o que de bom as pessoas são.
O mau?
Não me perguntem porquê,
mas há um mecanismo qualquer no meu cérebro
que o mirra até ao tamanho de uma ervilha.
(Conceição Sousa)
O mau?
Não me perguntem porquê,
mas há um mecanismo qualquer no meu cérebro
que o mirra até ao tamanho de uma ervilha.
(Conceição Sousa)
tu vens
Tu vens e dás-me uma má palavra,
o outro vem e, simplesmente, ignora-me,
a seguir vem mais um que esboça um sorriso amarelo,
e o que se esperava do próximo nem sequer aconteceu -
porque esse não veio.
E eu choro. Choro?
Não, não choro.
Bato o pé.
A tua má palavra é tua , não é minha: fica com ela.
A tua indiferença é tua, não me pertence: fica com ela.
O teu esboço amarelo é teu, não está em mim: fica com ela.
E quem não veio mesmo? Eu? Não, nem conheço: fica com ela.
Bato o pé. E esse, sim: é meu.
Anda cá,meu querido, que eu faço-te uma massagem...
o que é meu eu trato bem.
(Conceição Sousa)
o outro vem e, simplesmente, ignora-me,
a seguir vem mais um que esboça um sorriso amarelo,
e o que se esperava do próximo nem sequer aconteceu -
porque esse não veio.
E eu choro. Choro?
Não, não choro.
Bato o pé.
A tua má palavra é tua , não é minha: fica com ela.
A tua indiferença é tua, não me pertence: fica com ela.
O teu esboço amarelo é teu, não está em mim: fica com ela.
E quem não veio mesmo? Eu? Não, nem conheço: fica com ela.
Bato o pé. E esse, sim: é meu.
Anda cá,meu querido, que eu faço-te uma massagem...
o que é meu eu trato bem.
(Conceição Sousa)
escolho
Sou um ser humano. E como qualquer um de nós, seres humanos, tenho a possibilidade de fazer as minhas escolhas ao segundo. Escolho ser feliz, escolho viver, escolho ser quem sou, escolho escrever, escolho partilhar, escolho os afectos, escolho as boas pessoas, escolho não temer, escolho abraçar-te, escolho beijar-te, escolho amar-te. Isto é o que escolho sentir que sou. Se o acreditas ou não, é problema teu: não meu. Tento viver em paz, faço por isso e, na maioria do meu tempo, vivo mesmo: em paz. Nos bocadinhos de mundo em que me deixo atormentar, sofro, mas logo passa, porque ( e fixa bem isto !) quem manda no meu tempo de sangue e carne e dor sou eu - e eu escolho ser boa para mim e para ti. Não te iludas, não é contigo que comunico, mas sim comigo.
(Conceição Sousa)
(Conceição Sousa)
tecto
São as melhores, as que não têm tecto,
pois se não há tecto que as cubra,
também não há chão que as prenda.
E respiram a liberdade, bem fundo, sem emenda.
Não forçam o irmão à prisão
nem a companhia de nada,
e respeitam o imperfeito,
o singular,
a porta de saída.
É sem favor.
( Conceição Sousa )
*
pois se não há tecto que as cubra,
também não há chão que as prenda.
E respiram a liberdade, bem fundo, sem emenda.
Não forçam o irmão à prisão
nem a companhia de nada,
e respeitam o imperfeito,
o singular,
a porta de saída.
É sem favor.
( Conceição Sousa )
*
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