De vez em quando, nós, mulheres, apreciamos entregar os nossos corações, bem vermelhinhos, bem esponjosos, bem carregadinhos de sangue, em cima de uma bandeja, e dá-los a saborear a eles, aos que nos cegaram os olhos ( sem que o soubéssemos, claro!), aos que nos sussurraram meias-verdades nos ouvidos habituados à surdez ( estou a ouvir? ui!, estou mesmo a ouvir? que bom, ouço! é que pensei que nunca mais pudesse ouvir!). De vez em quando, nós, mulheres, saímos dos nossos corpos e colocámo-nos, à distância de uma esquina, a observar o suor que escorre, a saliva do deleite que parece querer esticar-se até nós, até ao sorriso do canto que observa aquilo tudo, que anui ao gemido a leveza do eco e permite à pele a cinza do arrepio. De vez em quando, nós, mulheres, deitamo-nos no canapé lânguido do tempo só para adoçar o bico à inteligência e calcular o trajecto a que o outro se dispõe a ir. Mas pensas mesmo que ao orgasmo basta o toque do corpo? Estás plenamente convencido de que as águas e o grito te dizem que és bom? É que, à distância do canto de um sorriso, há uma inteligência de um calculismo calado que te sabe aprimorado na tua esquina, a dar ordens aos fluídos e hirtos do teu estar sólido, para que a tua matemática não te falhe e anote no papel todos os ângulos imaginados.
( Conceição Sousa )
( Conceição Sousa )
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