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quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Vejam, enquanto podem.


"Um dia, meus belos e luminosos olhos já nada segurarão.

Um dia, já não verei as nuvens apressadas,

lá no alto,

escaparem, por entre os dedos de Deus,

e beijarem o azul quente de todos os Céus.

Um dia, já não contemplarei a doce brisa

a abraçar as rabugentas folhas,

que se amam na ramagem densa multicolor,

e se perdem e encontram quebradas no banco dos réus.

Um dia, as minhas íris, em vermelho possessas e ramificadas,

já não vislumbrarão os açoites da chuva que queimam na pele;

nem conseguirão perdoar ao ríspido vento,

o que empurra o corpo cansado,

e o obriga a avançar no gelo soprado –

sabor que escorrega de vida neste papel que me foi destinado.

Um dia, já não terei a visão de ti no meu pensamento,

pois, por muito que tente,

meus olhos já nada serão senão pó do tempo.

Um dia, já não serás luz cá dentro;

toda e qualquer escuridão que possa daí, agora, advir –

perto da que está por vir (supõe-se)-,

nada mais será do que fugaz e belíssima recordação do já morto momento.

Por isso, meus olhos de agora - os que conheço e estão -,

enquanto podem, 

captem, e intensamente,

 

todo e qualquer movimento (bom ou mau) a ocorrer –

na paisagem que vos sente, entende e dá prazer.

Vejam!

Sejam!

Chorem!

Sorriam!

Demorem-se...

Pisquem!

Abram!

Fechem!

Estagnem!

Rebolem! –

soltem a meiguice do que vos habita dentro!

Libertem o ser que vos faz sentir,

a cada segundo, o presente.

Amem: até que, por fim, vos tapem

de tudo o que vos sente."

 

(Conceição Sousa)

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