Número total de visualizações de páginas

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Acto 1

Paragem do autocarro.
Início da noite.
Trovões. Clarões. Alguns pingantes.
Cidade adormecida.
Quando o pano abre, o homem que nasceu para amar está de pé, olhar distante, as duas mãos a amparar a cabeça. Uma lágrima desliza no seu rosto.
No outro lado da rua, em frente à paragem, observa um casal. O homem de cara rígida não revela qualquer movimento, nem no seu corpo, nem no seu rosto. A mulher desencontrada olha-o, ora enternecida ora cabisbaixa. Uma lágrima desliza no rosto da mulher.

A MULHER DESENCONTRADA ( fitando, incrédula, o homem de cara rígida, com o olhar perdido e a voz presa) - Tens noção da vida que me és? Eu sei que me sentes, amor! Virares-nos as costas não é solução. Fala.

O HOMEM DE CARA RÍGIDA ( agora, de costas voltadas, quieto, em homenagem devota às estátuas) - Há loucos que nunca, de facto, amam. Há amantes que nunca, de facto, enlouquecem.

A MULHER DESENCONTRADA ( cabisbaixa) - Compreendo... furtaram-te a vida. Cabe-me encontrá-la. Vai, entretanto. E não voltes sem que eu a encontre.

O HOMEM QUE NASCEU PARA AMAR ( inerte e abespinhado, dirige-se à plateia) - Fui eu quem a trouxe até este lugar, à minha mulher. Fui eu quem lhe indicou este caminho: com ele. Fui eu...e, agora, sofro. Perdi-a.

(Conceição Sousa)

Sem comentários:

Enviar um comentário