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sexta-feira, 9 de novembro de 2012


-Quem diria…ninguém imagina os solavancos que dou para conseguir escrever umas linhas. É um corre-corre entre o quarto e os vários compartimentos da casa (principalmente a cozinha e a lavandaria). Escrevo duas frases e vou preparar a sopa. Entretanto, enquanto descasco as batatas, as cenouras e lavo os legumes, as letras bailam nas estantes de vidro onde guardo a loiça já lavada. Mais uma corrida ao quarto: anoto rápido. De volta à cozinha (esqueci o tempero: o azeite e o sal), preparo o frango, retiro-lhe as gorduras e apresso-me novamente na direcção do quarto (de caminho passo na casa de banho para lavar as mãos) porque lembrei: há palavras e estruturas desnecessárias nas linhas escritas anteriormente; banha a ser retirada. Quando dou conta de um cheiro estranho…a queimado: a queimado! Nova maratona: o frango!
-Eu sei. Tenho apreciado a tua ginástica diária de há um ano para cá. É de loucos. Nem sei se aguentas.
-Limpo o texto; apresso-me na direcção da lavandaria ( o sol não dura sempre), tiro a roupa da máquina e corro para a estender na varanda. Ao passar pelo computador, não resisto, sento e redijo mais uns versos. O filho chama: “-Ó mãe! Quantas arestas tem um paralelepípedo? Preciso de fazer um exercício, mas não encontro o compasso”. Toca a parar tudo e a procurar o dito. Ufa! A filha segura-me na camisola : “-Mãe! Vê o novo passo de dança que inventei! Dança tu também.” E eu danço pela casa toda, gordurosa no cabelo, com a faca numa mão, a caneta na outra e roupa húmida no ombro pronta a colocar no estendal (antes que o sol se vá). Faca: morte; ou caneta: vida.

(Conceição Sousa in "Tala, enquanto cura e nasce.")

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